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A questão central, o paradoxo engraçado, é que se o Senado se tornar transparente, se se moralizar, se abrir suas contas, o país ganha e a mídia perde. O poder da mídia reside na falta de transparência da sociedade. É o que permite a ela se tornar “dona” da informação, selecionando as que melhor lhe convem. É por isso que todas as campanhas midiáticas visam pessoas e escândalos pontuais - levantados de acordo com as conveniências do momento - e não mudanças capazes de impedir a perpetuação do erro.
- por Luis Nassif (http://colunistas.ig.com.br)
Sarney é Sarney desde que entrou na política. O que armou e aprontou depois de deixar a presidência é de conhecimento público e estava ao alcance da mídia desde as primeiras aventuras, ainda mais se tratando de um ex-presidente - o que justificaria o interesse jornalístico.
Nada se fez durante vinte anos. Permitiram-se abusos no Amapá, no Maranhão, permitiram que sua influência abatesse governadores eleitos, derrubados por motivos menores. Os ecos de suas aventuras rodavam todas as redações, desde as estripulias de Jorge Murad e Saulo Ramos, no seu governo, à ligação permanente com Edemar Cid Ferreira ou o escândalo da Cemar.
Mesmo assim, durante décadas mereceu todo o cuidado por parte da imprensa, e um carinho e proteção especial da Folha. O Otavinho sabe a razão.
Esse tiroteio infindável contra ele, agora, não tem razões nobres. A mídia faz o mesmo que em todos os momentos anteriores da vida nacional. Cria o clima, levanta a bola de quem quiser se apresentar e vai gerando fatos, tirando os escândalos da gôndola do supermercado e mandando bala.
Os verdugos de Collor apareceram na CPI das Empreiteiras. O Catão de hoje é o mandrião de amanhã. E, em todos os momentos, apenas são peças que servem ao jogo de poder da mídia. O Catão do momento, para se ter uma ideia desse jogo limpo e asséptico, é Arthur Virgílio, ator tão completo que é capaz de se escandalizar com aquilo que ele mesmo pratica.
Esse é o ponto central. Hoje em dia o maior poder do país de chama mídia. Ela é a única capaz de intimidar o Judiciário, o Executivo, assassinar reputações. O caso da Veja foi apenas uma amostra desse jogo. Juízes que se colocam contra, desembargadores, ministros, políticos, são fuzilados inapelavelmente. Não havia limites para esse poder, até o florescimento de novas mídias. O caso Satiagraha um retrato acabado da impunidade no grande jogo de informações acoplado a negócios.
Nesses anos todos, bastava uma fonte não se mostrar de boa vontade para com a mídia para ser fuzilada com adjetivos ou com factóides. Nem se fale dos interesses maiores, expostos agora nesse lamaçal em que se tornou o gasto com Educação de diversos estados - que passaram a adquirir maciçamente material de editoras jornalísticas como compra de proteção.
A questão central, o paradoxo engraçado, é que se o Senado se tornar transparente, se se moralizar, se abrir suas contas, o país ganha e a mídia perde. O poder da mídia reside na falta de transparência da sociedade. É o que permite a ela se tornar “dona” da informação, selecionando as que melhor lhe convem. É por isso que todas as campanhas midiáticas visam pessoas e escândalos pontuais - levantados de acordo com as conveniências do momento - e não mudanças capazes de impedir a perpetuação do erro.
Qual seria o poder da mídia em ambientes transparentes, onde não desse para armazenar escândalos e utilizá-los em benefício do seu jogo político particular? Qual seria o poder se, de repente, instituições assumissem seus erros mas enfrentassem a mídia sem medo?
O caso Petrobras é emblemático e cria uma dinâmica fantástica, no bojo da Internet.
Com seu Blog, a Petrobras se amarrou a um compromisso: o de não mais deixar perguntas sem respostas. Internamente, significará o fim dos feudos, a obrigação de todos os departamentos de fornecer a informação solicitada.
Esse modelo vai se expandir, se expandir até chegar na mídia. É inexorável. Quando chegar, alguns grupos jornalísticos terão condições de abrir o jogo, de responder às dúvidas dos leitores?
A história está prenhe de Catões que, no momento seguinte, entraram na alça de mira da opinião pública. E não haverá como, em um futuro próximo, essa lufada de transparência da era da informação, chegar à mídia.
Aí cada jornal terá que criar seu Blog, não apenas para discutir suas matérias, mas seus interesses empresariais ou políticos por trás de cada campanha.
E viva a imprensa livre
ResponderExcluirIn Folha de São Paulo, 22/07/09:
ResponderExcluirhttp://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2207200906.htm
Caridade e verdade
NINGUÉM podia deixar de ter simpatia pela velha "opção pelos pobres" da Igreja Católica, agora transformada em "opção pelos homens", na nova Encíclica "Caritas in Veritate".
Para Roma, a organização econômica é subordinada. Deve adequar-se à concepção da ordem social orgânica da igreja dentro da qual está imersa. Esta última fundamenta-se na caridade, que é o valor supremo do cristianismo. Roma sempre recusou o liberalismo e o capitalismo, fundados no egoísmo e no individualismo, e negou o comunismo, criação de diabólicos "engenheiros sociais". Para ela, corretamente, a economia deve ser submetida à ética. Entre esta sociedade cristã imaginada e a que vivemos, há enorme distância. Nada impede, entretanto, que com alguma ousadia ela seja encurtada. Se João Paulo 2º (com a ajuda da crise do petróleo de 1979!) derrubou o comunismo, por que Bento 16 não pode aspirar a cristianizar o fundamentalismo mercadista que dominou o mundo e parece produzir a atual destruição do homem?
Roma possui assessores (economistas profissionais da maior competência e mundialmente renomados) para analisar como funcionaria um sistema econômico cuja base seria a caridade e o altruísmo, problema tratado, aliás, em 1881, pelo grande economista F.Y. Edgeworth. Parece claro que, se for possível dar à caridade o caráter de imperativo categórico em indivíduos agindo em plena liberdade e esse comportamento levar ao estabelecimento de uma certa ordem (como o egoísmo parece levar), teríamos um mundo muito melhor.
Uma coisa, porém, é certa. Isso não será feito por "economistas de sacristia". Roma, por exemplo, não defende o "calote das dívidas" como acontece no Brasil. No máximo, por conta da caridade, recomenda (como no velho Pai Nosso) que o credor perdoe o devedor mais pobre. Não que este a rejeite!
No Brasil, a negação da dívida externa tem uma longa história, mas não há assunto em que o país seja mais desinformado. Alguns livros didáticos são analiticamente pobres, ideologicamente oportunistas e, o que é pior, ignorantes das estatísticas. Para eles, a "história é a política projetada no passado"!
Ainda agora vimos ilustre eclesiástico afirmar que desde 1973 o Brasil tem "dívida externa terrível" e que não devemos pagá-la. A verdade é que o Brasil superou a recessão mundial de 1974/75 sem problema e com pequeno endividamento. A afirmativa ignora que desde 1971 controlava-se a entrada de capitais: em 1973 o prazo mínimo para empréstimos externos passou de cinco para dez anos e o depósito compulsório para novos empréstimos foi aumentado em outubro para 40%. Por caridade, é bom procurar a verdade...
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